terça-feira, 27 de maio de 2008

NOVE DA MANHÃ


O trânsito de São Paulo. O ar empedrado de São Paulo. As buzinas de São Paulo que insistem no coro: Bi Bi, Fom Fom, Gostosa. E a impaciência que assinaria as minhas ofensas aos ouvidos do meu chefe e o meu pedido de demissão.
O carro da polícia de São Paulo posando valente em duas das três faixas de uma avenida, porque, talvez, algum ladrão, necessitado, pai de família, cheirador, desesperado, inexperiente, tenha sido surpreendido.
A insignificância de um semáforo verde em São Paulo. A chuva caindo nas poças de São Paulo. Os velhos e suas bengalas atravessando as faixas de pedestres de São Paulo. E o início da minha reunião com quarenta e cinco minutos de atraso do horário programado. Sem café, porque é mais importante ensaiar uma desculpa.
Uma hora depois, cinco ligações do escritório depois, três blocos de músicas depois - uma delas repetida quatro vezes - dois blocos de notícias depois e dez metros depois, percebo mais que o carro da polícia: um resgate, curiosos e verbos soltos no ar, como horas atrás, um corpo.
O corpo de um cretino atrapalha o trânsito de São Paulo.
(texto inspirado em “Construção” de Chico Buarque)
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