por Angélica Leal
Eu não me importo
com o seu relógio com os ponteiros sempre atrasados. Não me importo com os
bares e lugares que você escolhe. Eu já não te espero, nem te acompanho. Não me
importo com as vírgulas mal empregadas e as frases que você não sabe formular.
Não aguardo nenhuma mensagem, nenhuma carta num corpo de e-mail. Não me importo
se o telefone não toca, se nenhum alerta pisca. Não espero resposta. E para mim
não faz diferença se você se importa, não há nada de novo nisso.
Eu, que
sempre me incomodei com cada detalhe, permaneço agora em estado de indiferença.
Velho amor é passado, mas é sempre amor, apesar de mudar a forma e agregar a
ele outros sentimentos. Mas isso não tem nada a ver com o que eu penso a
seu respeito, aliás, quase não penso. Ignoro cada gesto, cada encontro casual,
cada bom-dia com sorrisos amarelos – atitude de dois estranhos
familiares. Finjo não ver, porque é melhor que sorrir.
Era meu
melhor amigo, mas hoje somos bons desconhecidos. Dois adultos que não sabem
viver sem se esbarrar, sem desviar os olhares. Que conversam no silêncio, na
distância, na mudança de vida, na troca de amores. Somos apenas duas crianças
que não aprenderam que para seguir em frente, com quem quer que seja, é preciso
perdoar. Não se pode ser apenas um quando os nós não foram desatados. Mesmo que
nada mais de nós realmente importe, é preciso saber olhar nos olhos e dizer
tchau, para que finalmente possamos dizer olá, sem medo.
Eu não me
importo com nada em você, com nenhuma mania. Não te quero comigo, nem espero
que você me dê a mão. Desejo apenas que um dia possamos agir sem culpa, que
saibamos, pelo menos, não desviar os olhos. Em algum momento, eu sei que
finalmente aprenderemos a amar de novo, depois de encararmos os anos que não
vivemos, apenas remoendo, levando todas as angústias e frustrações do nosso
amor antigo para nossos novos amores. E antes de pedirmos perdão a quem quer
que seja, que perdoemos a nós mesmos por invalidarmos qualquer possibilidade de
alegria sincera ao lado de outras pessoas. Por culparmos os outros pelos nossos
próprios erros.
Quem quiser conhecer mais o trabalho da Angélica Leal pode clicar no link do blog dela, o Cotidiano,
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