sexta-feira, 23 de julho de 2010

NIGHTS

não há noite em que passe pelo portão do edifício em que mora, sem buscar o olhar do porteiro. aguarda um recado há meses. espera tanto e há tanto tempo. mas o porteiro, quando não lhe esconde o rosto, apenas balbucia um boa noite tímido e carregado de sotaque. perdeu o recado ou presenteou algum outro morador mais feliz? sabe, enquanto atravessa o caminho de pedrinhas portuguesas, reformado há dois meses, que caiu no esquecimento. mais uma vez. o recado nunca virá. foi só mais uma promessa que um dia ouviu. dessas ocas que, recém-nascidas, evaporam ou escorregam por um bueiro, e que acreditou, talvez pelo descostume, talvez por uma inocência forçada.


no elevador - em que já estiveram e que não se lembra, culpa do sentimento tempestuoso que a agride na presença dele - o recado é tão passado quanto estar com ele. é que a insistência e o cansaço do que sente volta enquanto assiste a um dvd ou estende os lençóis.

já no segundo andar, não pensa mais em recado. nas noites entupidas daquele sorriso que quase fala de tão vivo, e que reprime possíveis palavras, porque sabe, no fundo sabe que o pouco que escorre pelos seus lábios é o suficiente para aprisionar mais um coração.

no segundo andar, ele também foi esquecido. mesmo assim, no dia seguinte, enquanto o trânsito que acabou de superar ou uma calçada cheia de buracos preenchem a cabeça dela, talvez zere os pensamentos e olhe para o porteiro, ansiosa por uma novidade.
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