domingo, 23 de novembro de 2008

UMA CARTA

 

   Quando você voltar, eu vou arremessar no seu cinismo todas as flores que ganhei. Você vai espanar as pétalas que escorreram para o ombro e partir. Quando estiver a cinco passos de mim, vou cantar aquela música que você não decora. Você vai voltar e provar que prestava atenção quando eu te ensinava. Eu vou ouvir, séria. Vai me olhar com a mesma expressão de quando leva bronca, pegar a rosa mais despetalada do chão e entregá-la a outra, como você sempre faz. Eu vou desligar a sua cena e tomar o copo de cerveja para não mostrar que minhas mãos tremem. Vou esperar no balcão alguém com um ramalhete. E quando você voltar eu vou atirar mais flores na sua cara e depois que você cantar pra mim, eu volto pra você. Você sabe. Eu volto.

sábado, 22 de novembro de 2008

*

Assim que coloquei o pijama, o telefone tocou. Ana demorou para falar alguma coisa e quando disse:

- Pedro,

Mais silêncio e:

- Pedro, boa noite.

Desligou.

Acho que ela não queria me dizer isso.

 

*

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

*

Levanta-se da cadeira e passeia devagar pelo escritório.

- Que delícia andar no meio da sala! Ela parece mais vazia hoje.

Só que a sala sempre esteve daquele jeito. Com o mesmo cheiro de mofo, a mancha no carpete perto da tomada, cadeiras enferrujando e papéis usados. Uma insatisfação nauseante estampa o rosto dos funcionários e a água do filtro parece vir de algum prato de samambaia. O homem barrigudo vestindo camisa de listras vermelhas e pretas rosna para preencher o vazio que a frase deixou.

Volta à cadeira, seu celular toca. Colore o ambiente com o mesmo sorriso patético de dias seguintes.

*

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

VERONIKA

 

Eu disse  que postaria apenas uma frase dos contos que começo a escrever sobre as personagens da próxima peça. Mas me empolguei e vou mandar o miniconto inteiro. Tudo bem... Se alguém quiser comentar sobre o clima, abuse!

 

*

Muita coisa pinga no vazio do crânio:

a frase de um livro,

um atropelamento,

um moinho,

uma maca,

pernas mancas,

patos brancos nadando em sangue coagulado.

 

Mas meu olhar arregalado só tem um alvo.

Encara intenso. Briga de retinas.

Você dentro de si, controlado. Até quando?

Continuo explodindo até que você desperte.

*

 

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

ASSIM PREFIRO

Solta
atiro
o brilho do rímel

Borro noites

Meus cílios confusos
confiscam atenção

Carecem de olhos

Brinco de estrela
das suas raras aparições

Na sua falta
esfaqueio mãos ingênuas

Sem remorso
Sem cabeça

Solta

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

*

Na minha mão tudo vira crise.

Se pensam que sofro com isso, estão certos.

Se pensam que me esforço para mudar,

saibam que sou bem acomodada.

 

*

domingo, 2 de novembro de 2008

*

Meu beijo é mentiroso

com frieza cobra vingança

bagunça cabeças


Deixa a dúvida na presença

esquenta lábios à toa

faz cena

fascina


Depois se afasta

e tranca na noite anterior

outra leviana conquista

*
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...