segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

DIA-A-DIA



O teto manchado de infiltração e o ventilador a passos preguiçosos. A maçaneta antiga, encoleirada por cinco peixinhos desejando-me sorte e feliz aniversário. A camisola no chão, a calcinha no chão, o pesadelo que tive e fios de cabelo. Meus pés no chão. Gelado. Água quente na raiz do cabelo. Pingos espancando o piso abafam lágrimas que se misturam ao xampu, ao sabonete, ao que eu gostaria de dizer. sons de vira-latas quebrando a chuva daqui de dentro. uma meia felpuda chupando um tornozelo ainda encharcado. e pente. e vestido. e perfume. e batom. e aquele laço de cabelo que eu ganhei só pra te fazer sorrir. chaves resgatadas por mãos secas e um dedo torto. insetinhos assassinados por limpadores de para-brisas e um coração, decorando vidros saciados pela garoa de ontem. O céu solitário. E antenas e radares e pontes e uma cortina cinza transparente embrulhando tudo. O crachá permitindo que portas abram os braços e te recebam no mundo de ontem. E de anteontem. E de amanhã. pausa para tomar ar. A fumaça do café e suas promessas. talvez um esboço de sorriso. talvez. o mundo de ontem novamente. flutuo. pedidos de resgate. Fujo. O seu abraço e a lua e todos os clichês que se realizam de vez em quando. Aporto e permaneço. em vez de disfarçar você com banho. escolho encarar meus sonhos em vez das hélices todas as manhãs. aqui ainda te enxergo, sem que você perceba.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

EU E AS BARATAS

barata não morde. não pica. não rouba. não me força a comer pombas vivas. então por que eu tenho medo delas?

0_o

de todas. qualquer uma. até das mais minúsculas. flagradas na pia do meu banheiro. junto com restinho de pasta de dente, que sempre cai quando eu tou muito sonolenta.

uma família inteira veio morar no meu apê - pequeno, mas com aluguel em dia - junto com uma mesa que eu trouxe pra dentro dele. cenário duma peça de teatro minha, que não tinha onde morar. esconderam-se nas frestinhas da madeira. fugitivas. iysgbiydrgfvifsdgtáquipariu. acolhi a mesa, sem saber das migrantes, que acabou virando depósito de roupa usada. hehehe. algumas parentes de espírito mais cigano talvez tenham optado pelo carro do meu amigo - que serviu de carreto. ou carona - nos buraquinhos do estofado tocados por cigarros desatentos.

era quarta. passou quinta. chegou sexta. no sábado de manhã eu e um vestido longo e verde-água viajamos pro sul do país. vítimas de um convite irrecusável -  amadrinhar um casamento. num domingo fervente, em que o fantástico já tinha se despedido há horas, chegamos eu e o vestido - ausente de manchas etílicas. tomei cuidado :) -  e demos de cara, ou melhor, de pé com a família das baratas. as crianças brincavam no meu piso de taco ao redor da maldita mesa e, assustadas com a luz que se acendeu, correram pra algum lugar - talvez o colo de mamãe. o que faz um locatário quando se depara com invasores? eu tac tac tac tac imediatamente e sem dó em todos os filhotes que encontrei. (silêncio) porque eram filhotes. ou porque eu ainda não tinha percebido do que se tratava. do meu maior medo! e não tou falando sobre a condução da carreira da Jewel. mas de minhas arquinimigas. pisei nas pequenas que não me enfrentavam como fazem as maiores. e é isso, caro leitor, o que mais assusta. essa petulância das baratas. que, ou vêm pra cima, ou se escondem e esperam pacientes o momento certo de... subir em cima de você! KINOJO!!!

o tamanho do problema só chegou quando fui esvaziar a mesa - a maldita mesa - e... 0_0 a mãe descansava em cima do meu biquini. ou tomava sol, sei lah. hdcbgfhcdfgsbaratafiadapiiiiiiiiiiii
é guerra, barata? então você vai ver! fiz a única coisa sensata praquele momento: liguei chorando pro zelador.

e enquanto esperava o seu joão subir, fui pro facebook atualizar o meu status.

2 minutos.

ninguém deu a mínima pro meu problema, como qualquer pessoa em qualquer rede social. ou real.
o seu joão chegou e me explicou que tem mais medo de pernilongo, oxente. mostrou até as canelas pra provar. esmagou com o chinelo todas que encontrou. vasculhou possíveis esconderijos. e desceu a mesa pra garagem. eu já não chorava mais - foi apelativo, confesso - e só pensava em COMO EU VOU FAZER PRA DORMIR???

por 3 noites eu voltei à infância e deitei no claro. a ideia de uma barata entrando no meu ouvido, como vi uma vez num episódio de House, ou na minha boca... KINOJO!!!

elas foram sumindo. sumind. sumin. sum.

de vez em quando ainda encontro algumas desgarradas. pequeninas, ainda bem. aí, em vez de chamar o seu joao, descarrego toda a minha raiva, coragem e inseticida em cima delas.

> I  

até murcharem. murcharem. murcharem.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

POST-IT


na gaveta, post-its, canetas, sujeira e uma foto de quando éramos.

na agenda, papéis de balas chupadas, lágrimas.

na carteira, uma folha de arruda, uma nota rasgada, comprovantes de compras e de solidão.

na goela, mágoa, pigarro e páginas indeletáveis.

no gatilho, sua cara.

na janela, a espera, o vento.

nos sonhos, todos os segredos destrancados.

nas solas, fios de cabelos. só.

no coração, pó.

 
 


sábado, 19 de novembro de 2011

PERSONAGENS DO PERU - O PERUANO BANCÁRIO



Me deixa contar deste peruano, que conheci a caminho de Aguas Calientes, que é a cidade mais próxima de Machu Picchu e que todo mundo costuma passar a noite antes do passeio. Eu subi no trem, cruzando os dedos para desta vez a sorte me atirar um rapaz bonito na poltrona ao lado, e quando achei a número doze do vagão B, vi que meu vizinho estava atrasado. É jogador de futebol, criança ou vai ficar aí vazia. É sempre o que acontece comigo. Me lancei do ladinho da janela - gosto de ver a paisagem correndo - e abri o meu livro. Tava no comecinho, era do Alberto Manguel - eu gosto desses argentinos quando escrevem. Aí chegou o fantasma da poltrona vazia, que quem sabe mudaria o rumo dos meus quatro dias no Peru. Eu sou azarada mesmo. Fisicamente, era a pessoa mais desinteressante que eu conheci na vida. Sem drama, era mesmo. Ele tinha a versão espanhola do seu nome, então Juán, e arregalou os olhos do mesmo jeito que você quando me viu pela primeira vez. Ele era um cara feio. Muito feio - apesar de ter os seus olhos quando arregalados. E diferente da reciprocidade que te dei, eu tive nojo dele. Não sei se porque suava ou porque parecia babar por mim. É, ele ficava mostrando aqueles dentes como se tivesse acertado a loteria. De repente eu era, sem dúvida, a mulher mais bonita do mundo. Exatamente como você me fez sentir naquela noite e em todas as outras, sempre que a gente se encontrava cambaleando no bar, culpa da labirintite que beber até o começo da manhã dá. O peruano era grande, dum jeito nada atraente, e preenchia a sua poltrona e mais um pouco da minha. Eu não gosto de viajar ou ir ao cinema sem poder encostar os cotovelos nos braços das cadeiras. É desconfortável. Ele era espaçoso ou tava inventando um jeito de relar em mim. No Peru as coisas devem ser assim. Mas eu não deixei ele tocar um pelo do meu braço. Me joguei bem pertinho da janela pra ele não me encher o saco. Mas o peruano deixou claro que queria papo e, como havia momentos em que a minha retina parecia descolar e eu não conseguia mais ler o livro do Manguel, resolvi matar o tempo - até meus olhos se recuperarem - respondendo a algumas perguntas dele, exibindo um sotaque portenho que tentei imitar dos pais da Gabriela. Ele elogiou o meu espanhol. Isso deu uma acarinhada no meu ego e eu devo ter até sorrido pra ele, não tão aberto como fiz pra você quando se apresentou pra mim. Você ainda lembra? Porque eu sim. Caramba, como o seu olho brilhava. Faiscava. Eu era a mulher mais bonita do mundo pra você também.  E eu me apaixonei ali mesmo. Na porta do banheiro. Deprimente só pra quem ouve ou lê essa história. Voltando ao peruano suado ou babão, contei pra ele o que eu fazia no Brasil e descobri que ele era bancário e eu pensei Nossa, e o cara ainda é bancário. Eu me enchi da conversa, porque não entendia um terço do que ele falava, enrolando a língua ou salivando em cima de mim. Tava cansada de perguntar Quê? e não entender quando ele repetia. Então voltei pro livro, porque tava mesmo interessada na história - era policial e tinha vários narradores e surpresas - deixei o peruano bancário comendo sozinho o amendoim que serviam no trem. Imaginei que podia ter um pedaço bem no meio do dente quando ele sorrisse daquele jeito insuportável pra mim de novo. Quando chegamos a Aguas Calientes e eu dei graças a Deus que ia me livrar do fardo de mulher mais bonita do mundo, me despedi como se tivesse adorado conhecê-lo. Às vezes eu consigo ser filha da puta com esse tipo de homem. Eu não dei a entender que queria algo com ele, sabe? Só quis consertar toda as minhas esnobadas durante o percurso e sair de boazinha. Sei que isso deve confundir pra caramba a cabeça de um cara que te olha com faíscas nos olhos. Não você, claro, ele. Deixei a estação com a consciência tranquila, sem pensar no que o peruano sentiria. Afinal, eu nunca mais veria o cara, certo?

Assim que me instalei no hotel, resolvi sentar pra comer alguma coisa peruana, tipo ceviche ou porquinho-da-índia, e tomar chicha ou pisco, num restaurante decorado com trabalhos artesanais e aqueles tecidos tão coloridos, de que até comprei um tênis. Eu estou no fim duma sopa de quinua e quem desce as escadas do restaurante que abrigava uma pousada no andar de cima? Quem me dispara aquela merda de olhar que me obriga a lembrar de você? Lógico que o peruano se convidou pra sentar comigo. Acho que porque fui simpática, não tava muito a fim de parecer louca e fingir que não o tinha visto depois da minha despedida super fofa na estação. Enfim. Por dentro eu tava irritada. Minha noite naquela cidade estava destinada ao fracasso. Eu sugeri que ele pedisse a mesma sopa de quinua e ele obedeceu. Acho que quis me agradar, porque não me parece o tipo de cara que janta sopa. Depois de comer, eu pensei em dar uma volta por Aguas Calientes, que é uma cidade bem charmosa e bem pequena também, e por causa desse tamanho minúsculo eu não pude fugir dele, inventando que ia dormir. Ia topar o peruano na praça e ele saberia que eu tinha mentido. Aí Adeus boa moça que se despede com meiguice na estação de trem e Bem-vinda vaca que ignora homens feios e chatos e suados e bancários e que te olham como alguém que vai te magoar um dia. Dei uma volta xoxa com ele pela rua principal e depois sim falei que queria ir dormir. Eu queria mesmo. Esse peruano me dava sono. Não falava nada e quando abria a boca era no meio daquele sorriso bobo, que só você pode ter. É logico que ele me levou até a porta do hotel. Saco. Me despedi sem ser tão gentil desta vez. Vai que.

No dia seguinte eu finalmente conheceria Machu Picchu e acordei cedo pra pegar o ônibus. Na entrada do parque, descobri que tinha esquecido a bateria da máquina fotográfica no quarto do hotel e acabei pedindo pruma freira me fotografar durante o passeio. Percebi que um grupo de caras tava rindo de mim e eu me senti meio idiota por parecer que viajava com minha tia-avó freira. Isso não foi nada porque no começo da caminhada, num daqueles imensos terraços de Machu Picchu, sentadinho com sua excursão, tava lá o peruano. E aí não sei o que me deu, senti vontade de contar pra ele que tinha esquecido a bateria da máquina no quarto e ele se propôs a tirar uma foto minha e me mandar por email. Esse foi um pretexto pra ele pegar o meu email. Você tá entendendo? Gente como ele sempre arranja um pretexto pra pegar o seu contato. No fundo ele sabia que não ia passar disso, nem se eu enchesse a cara de pisco no Peru, longe de todo mundo que eu conhecia. Eu anotei o email num papel pra ele. Nunca mais vou ver esse carrapato mesmo. E se o nome, o sorriso e o olhar dele têm alguma relação com você, esse email nunca vai chegar e pronto, obrigada, não vou ter mais notícias desse tal Juán. Tratei de me juntar ao meu grupo e deixei o Juán lá com o dele. Durante o passeio não nos vimos. Esse azar me foi dado no fim, ele quis porque quis fazer uma foto minha numa escadaria e na hora do clique a bateria dele também acabou. Eu tava lá com uma cara de besta sorrindo pra máquina dum cara chato. Ele pediu pra eu esperar, que ia desligar e ligar de novo e eu fui muito bacana em concordar com a ideia. Aí o grupo de caras que já tinha rido de mim com a freira passou e me viu posando pra máquina do peruano. Eu me irritei e desci a escadaria, falei Nos es necesario, Juán, gracias. E saí aindando na frente dele. Me deu sede todo o passeio e o estresse da foto, então saí do parque pra comprar água e ele veio comigo. Sem eu pedir. Procurei me afastar enquanto me hidratava, olhando pra Wayna Picchu. Como aquele lugar era lindo. E tava cheio de gente que eu poderia conhecer e tudo mais. Me aproximei dele - o pescoço pingava de tão suado - e perguntei se ele tava indo embora, pois eu ia entrar em Machu Picchu de novo pra ler o meu livro em um dos terraços. A cara que ele fez não foi boa, mas pelo menos foi de alguém que entendeu que eu não queria a companhia de ninguém pra ler o livro do Manguel.

Mais tarde, no almoço, sei que ele me viu sentada na varanda de um restaurante sozinha, mas dessa vez resolveu me ignorar. Se você acha que eu só gostei de você porque fui ignorada, está errado. Agradeci ao deus sol por deixar de ser a mulher mais bonita do mundo naquele instante no Peru e continuei o almoço. Foi a última vez que olhei para aquele cara todo desinteressante.

Uma semana depois, recebi em minha caixa de entrada a foto com a montanha Wayna Picchu ao fundo e o quanto o autor do email tinha gostado de me conhecer. Achei meio humilhante. Mas deve ser uma fase ou não gostei mesmo dele nem daquele olhar iluminado. E eu fiz o que você faria comigo: nunca respondi. Eu não vou ver mais esse cara, não é? Tenho até receio de pensar isso em público.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

DENTRO DA PISCINA



Talvez fosse tímida ou careta ou as aulas de religião haviam cumprido seu papel. Pecados pagos com rezas e a vida continua, irmã. Talvez simplesmente não pensasse em garotos, nem que pudessem chegar tão próximo, como as mãos de Vítor na calcinha do meu biquini. A cosquinha que senti era de quase fazer rir. Quase. Olhar para a cara dele nem pensar. Mais justo sair da piscina infantil e levar o fato ao julgamento da coleguinha, uma ruivinha vesga. Poderíamos decidir juntas o que tinha acabado de acontecer.

- Ele também passou a mão em mim!

Então isso era Passar a mão? Não pode, reza três Aves-Marias, lembrou o fantasma da mãe. Menina que deixa passar a mão é galinha. Galinha eu sabia o que era e não queria ser uma. Acho.

- E também passou no meu cu.

Não pode falar Cu também, um Pai-Nosso. Concordei com o fantasma. Sempre achei essa ruivinha vulgar. Ou a minha mãe disse que ela era. Não me lembro.

- É gostoso, né?

Você, leitor, se sente obrigado a concordar com um Né? Eu sim. Ou porque tenho pena de chatear as pessoas ou porque tinha gostado da sensação que os dedos de um garoto mais velho tinham despertado na minha, você sabe. Voltamos as duas para a piscina então.

Éramos as únicas crianças aproveitando o sol da tarde e as férias no condomínio. Vítor à espreita. Esperando nossa fingida desatenção. Aos nove anos, eu nunca a tinha espiado nem por um espelhinho durante o banho. Não entendia de onde Vítor tirou a estranha ideia de roçá-la. Criatividade. Eu podia mais. Muito mais do que usá-la para fazer xixi.

Eu mal tinha deixado a água molhar a coxa, Vítor decretou sua preferência e avançou na ruiva como um enxame. Ela parecia ter frequentado alguma aula que cabulei. Não me estranha, já resolvia equações e aprendeu a Salve-Rainha antes de todos. Ela não restringia as áreas do seu corpo para os dedos de garotos de treze anos. As garras do Vítor, acho que cortadas por linhas encharcadas de cerol - assim desconfio pela aspereza que pude sentir na minha vez -  deslizavam sem economia pelo corpo da ruivinha vesga. E ela reagia como se treinasse a vida toda com bichos de pelúcia, dos grandões, trancada em seu quarto de noitinha, longe dos ouvidos dos pais. Eu assistia a tudo em parceria de um sentimento próximo àquele quando a sua irmã ganha uma Barbie e você meias brancas de Natal. Algumas cabeças espionavam, emolduradas pelas janelas dos apartamentos mais baixos. Vítor não me notava mais. Eu ia perdendo as esperança de brincar de quase riso de novo. Como aquela zarolha poderia vencer o meu rostinho de boneca? Se eu morresse afogada, talvez nem as cabeças curiosas notassem. Eu não tinha mais nada.

Na tentativa de provocar-me o quase riso, meu mais recente amigo, tentei eu articular as  falanges, que de tão delicadas e medrosas recusavam-se a me explorar dentro da água. Eu precisava de Vítor, mas ele e a vesga continuavam num insuportável nado sincronizado e tátil. Então tirei a calcinha do biquini, pensando que ele poderia estar enjoado da lycra como obstáculo. Acomodei-a na borda da piscina e esperei. Esperei. O fantasma da minha mãe gritava, enquanto Vítor se aproximava. Eu pensava que se eu fosse galinha mesmo, poderia resolver com três aves-marias e um pai-nosso no próximo domingo. Mas a brincadeira estava ganha. E eu quase riria a tarde toda.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

VONTADE DE RESPIRAR


Clara não tem olhado pra dentro. Faz mais de um ano. Desde que. Desde que abandonou a sua banda. Parou de ouvir música, como se numa dieta. Foi naquele dia. Ela decidiu nunca mais ligar o rádio. E o ignora até hoje. Eu sou testemunha. Passávamos as tardes de sábado coladas ao micro system que a tia deixou, quando foi morar com aquele rapaz, dezessete anos mais novo. Que encarava os meus peitos. Talvez a minha bunda. Não tive coragem de descobrir. Por causa dele, ainda evito as blusas decotadas, nunca sei quando vou encontrar garotos, donos do mesmo olhar dissonante, soltos pelas ruas. O micro system tem cômodos para duas fitas cassete, cinco CDs e um vinil, e embora minha mãe tivesse se livrado de todos os discos que colecionamos até o nascimento do CD, ainda podíamos ouvir os de Roberto Carlos, Vinícius de Moraes, Elis Regina e Aretha Franklin, que consegui salvar, graças à gaveta de calcinhas. Foi como abrigar fugitivos. Clara sempre cantava por cima da Aretha e eu me perguntava como ela ainda conseguia ser tão branca.

Nossos sábados eram comemorados no tapete felpudo e verde da sala de estar. Deitávamos em nossas almofadas gordas, as mesmas que éramos obrigadas a usar toda vez que a tia do interior vinha de visita e nos tomava os travesseiros para cumprir suas noites bem dormidas.

A Clara que dividia músicas comigo não é essa que toma o café da manhã na cadeira ao lado da minha, antes de mim, para que eu não a meta em conversas. Ou a que se tranca no quarto durante as noites e talvez chore quando todo mundo dorme ou seja vítima de sonhos desafinados. Se posso voltar ao minuto em que Clara deixou de cantar, gostaria de dizer-lhe que foi rebeldia. Os dias de hoje só conhecem a mudez de minha irmã. Não há backup do som açucarado que só a voz dela fazia.

Eu acho que sinto os olhos da Clara alagando toda vez que a mãe estaciona num canal de TV exibindo um show. Eu posso ver a tristeza da minha irmã se escondendo debaixo de sua indiferença. E escapando pro quarto, onde talvez desague mais uma vez ou agrave a frustração com algumas notas engasgadas desde aquele dia. A Clara tem certeza que nunca soube. Meu Deus, ela nunca se ouviu? Ela se esqueceu? A banda tinha um líder. Toda banda tem. Todo líder tenta forçar suas perspectivas na goela alheia. Todo líder no fundo é inseguro e usa o dom da manipulação pra embelezar suas próprias ideias. A sede do líder só é estancada quando consegue se enxergar em seus discípulos. Todo líder entulha na sua cabeça que você não passa de um equívoco que o mundo acolheu sem querer. Todo líder é narcisista pra caralho. E assim Rodrigo calou Clara. Temo que pra sempre. Por que Clara não reage? Por que ela simplesmente não grita? Prefere sobrar silenciosa pela casa. Pelas ruas do bairro. Em festas de família, é a mesma personagem muda. E se, eufóricos e bêbados, revivem os velhos tempos, insistem numa Clara de antigamente. Insistem na voz cor de rosa cintilante que ela borrifava em microfones. Que combinava com violão e bossa-nova, mas também com guitarra suja e letra suja. Clara não se reconhece nas histórias que eles contam entre cuspidas alcoólicas e risadas sem sentido. Ela ouve sua vida como se de uma outra pessoa. Rodrigo foi competente. Rodrigo construiu tão bem a história de cordas vocais irrelevantes. Rodrigo, seu mentor. Acreditou como em coelho de Páscoa. Não acordou desse pesadelo mentiroso. A ingenuidade da Clara deixou Rodrigo se espalhar por seu corpo até estrangular a coisa mais bonita que ela sabia fazer.

Hoje arrisquei ouvir Aretha. E hoje é sábado. E Clara nos deu as costas, pegando a chave do carro, presa à mesma bolinha de futebol suja, presente do ex-namorado, que ela nunca gostou tanto assim - e talvez, por isso, não se importe em manter. E enquanto Aretha arranha as paredes ocupando a sala, a casa, Clara pausa melancolias. E leva o coração para pegar um pouco de ar pelo bairro em que crescemos. O vento geladinho entrando pouco pela janela, mas o suficiente para trazer cheiro de ontem. Clara inalando passado. Daqueles tempos em que você mora pertinho da casa do namorado e, em fins de anos escolares, rabiscam a sua camiseta com nomes e promessas que agora você custa a decifrar. A vontade de ser. Canta, Clara! Feliz 98!

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

YOU

quando tudo aquieta. e eu tenho que voltar pros meus DVDs. antes disso. quando eu desvio de poças e pessoas no meio da rua. de restos de cachorro. quando dá seis da tarde e eu procuro outra coisa pra pensar. você você você você você quer? - já cantou a celebridade com quem gravo na semana que vem.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

e tem a emoção, neblina na estrada. e tem experiências que eu não pedi, porque prefiro doce. e tem o que eu não posso controlar. é tudo isso se esfregando em mim. e tem aquela noite em que eu vesti flores. e essa imagem assediando minhas noites seguintes. alguma coisa no meio da rua acontecia. talvez leveza. ou só teatro. embora eu leia, sem embaraço, felicidade, que é quando você sente vontade de sorrir. eu não me contaminei, porque um dia quase morri disso. e pode ser que meus anticorpos estejam mais confiantes e felizes. e como o clima está ameno, vento nenhum vai se aproveitar da minha vulnerabilidade. chuva nenhuma. romance nenhum.
- assim pensou o monstro que mora dentro de mim.

sábado, 22 de outubro de 2011

na parte de dentro, aquela perto do peito, o esquerdo, tem fumaça. desembaçar fatos e separar de sentimento requer outra identidade. o corpo da vizinha. é o meu inimigo. apaixonado e imbatível. embora eu tente, se acorrenta a minha cintura. talvez seja melhor oferecer o outro lado da cama para ele dormir.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

é quase mortal e fúcsia. a garotinha de cabelo liso sentada em um balanço enfeitado de lacinhos. é quase aquecimento global a cor da paisagem. é quase terrorismo os urubus que esperam a queda dela. tão angelical e triste. tão alimento e alvo. se depender da saia ela não cai. mas o olhar. o olhar é de alguém que pode se jogar de tédio. de cansaço. esses urubus nunca vão sair de lá? é só o que ela tem. e uma hora, um toque fica tão inevitável quanto as lágrimas de redenção. ela não tem saída.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

de verdade. pode ser mesmo que eu seja o oposto desses brincos de pérolas. ou só um pouco deles. pode ser que a última frase que te disse destoe das minhas ressacas. e até que a ideia que postei dia desses seja a minha leitura de um personagem tranquilo. mas esses pedaços todos são meus, sim. o bolo inteiro que eles formam é que anda um pouco em blur desde que eu. meus amigos não me reconhecem e o que vejo quando encaro o espelho é mais uma tentativa de. pelo menos. did I? não fiz de propósito. foi apenas uma época deixando vazar céu azul e sucos de laranjas e as flores do meu vestido. mas não consigo esconder que rajadas dele me ofuscavam enquanto. pensei nele quando atuávamos a cena que sempre me negou. me recuso a fingir que ele não reestreou durante aquela noite na plateia. me tocava. não ele. a lembrança dele. as promessas dele. a ideia do que ele um dia seria pra mim. você como argamassa de poros vazios. a tinta caindo. o meu senso de humor dando as boas vindas. a parte de mim que pinta os olhos e se veste de botas pesadas para se identificar com o que foi e não quer mais. qual o tema desse amontoado de confissões? um feijão no algodão molhado.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

foram lágrimas de lembranças. apenas. como se pega de surpresa.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

AQUI!


eu pendurei luzes de Natal na minha saia. você reparou? eu aproveitei pra pintar os cílios de verde e rir bem alto toda vez que a campainha toca, mas você lia alguma coisa interessante. eu enfrentei o espelho depois disso tudo e ele rachou de preguiça. os cacos explodiam alguma palavra que já ouvi quando acordo de pesadelos enrugados. eu entrei no banho e os enfeites escorreram com um sabonete infantil. Eu escolhi um vestido discreto, porque não quero parecer uma. você sabe. pode ser que eu seja uma. mas não tenho certeza de. depende do mês. depende dos olhos. eu saí correndo, porque eu não sei. se a cor do meu cabelo fica bem. se meu português tá correto e as minhas unhas limpas. não sei e não quero falar do que não gosto. quero só criar bolhas de sabão em cima dum escorregador. pra elas voarem bem alto e furta-cor. pra estourar no nariz de alguém. no seu.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

CRUZAMENTO

Foi uma história em fast foward. Quinze segundos eu acho. Eu assisti à transformação de um personagem. Grande ator esse que encontrei na rua. Me pediu um beijo, que recusei. Talvez ele não esperasse, porque um vidro aberto em uma madrugada quente demais para pertencer ao inverno, tenha a ver com disponibilidade óbvia. E pode ter sido que quisesse disfarçar a tristeza da minha rejeição. Pode ter sido isso. Feri os sentimentos de um desconhecido. No segundo ato, vi em seus olhos a mudança de cor. Disse que chamaria a polícia. Mostrou-me o pescoço. Um corte. Repetiu a polícia. Os olhos focados em mim. Esperei um revólver. Esperei um canivete. Agradeci não ter vidro automático e paciente. Bloqueei a voz dele. Meu pânico ficou pra dentro. Exibiu-se ainda na frente do carro. Na faixa de pedestres, como manda o civismo. Ainda falava. Do corte. Eu lia Polícia em seus lábios. Meu coração batucando e ele se foi. Foi pra polícia. Meu acelerador me salvando dali.

sábado, 3 de setembro de 2011

SLEEP

O corpo medroso prevendo furacões morde a própria garganta. Qual recado urgente o coração precisaria desafogar desta vez?  Mãos proibidas de seu pescoço e de copos americanos. O dia estável. A vida escrita em quantas páginas eu mesma determinar. Olhos surdos a sua presença. Ou mornos. Uma manhã de sábado sem lembranças indigestas da noite anterior.  

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

entre nós, um tuíte. algumas estações do metrô. duas horas. as mesmas cervejas. muitas mentiras. incertezas. o palco. um pouco de ar. talvez um segundo. um telefonema mudo. uma música de karaokê. um maço tragado. meio abraço. um cacho. aquele que guardei. a foto 3X4, que queimei. a cama silenciosa. o bar da moda. espaços curtos, insuficientes pro meu nós.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

MEU EX-PERFIL

roteirista do sbt, autora de muitas peças de meia hora, filha de uma mãe que ainda me chama de branquinha, adoradora de palavrões e cerveja heineken - minha grande sabotadora ou desinibidora, dona de diários cheios amores platônicos desde os sete anos, romântica por educação e realista por vivência. com um único sonho neste mês: patinação artística no gelo - eu, glíter, sainha e uma boooua black music esquentando a pista.

domingo, 31 de julho de 2011

nao foi saudade. foi abstinencia.
eu não respirava. eu sonhei com locação. me falaram que bebiam com você. eu subi a rua em busca de ar. eu preferi fumaça de cigarro. eu lembrei da última vez naquele lugar. o ar sumindo. eu participei de duas brigas. não acertei o penteado. meu coração ainda batuca de energético ou de desgraça. você. você. alguém diferente. tudo o que deixei de fazer. as festas que não dei. podia estar de saia. podia estar com você. não devia pensar nisso. eu não terminei o roteiro. a geladeira tá vazia. meu dia tá vazio. você tá aí? o ar fugindo.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

MEUS DOMINGOS DE OURO

Eu me lembro das noites de domingo que passava em Santana. Na época, meus pais moravam na Europa por motivos familiares. Eu gostava de comprar vinho, fazer uma massa com o molho ensinado pela nonna e alugar DVDs na Blockbuster pra assistir sozinha. Tenho saudade. Eram dias mais românticos e eu lamento terem escapado de mim.


Eu esnobava os lançamentos e toda aquela gritaria acumulada e bem produzida de Hollywood. Só suportei de criança. Meu encontro era com o Cinema Europeu, pensando que alguém, igualmente interessado no assunto, poderia vir conversar comigo durante esses passeios à videolocadora. Eu era solteira e eram realmente dias mais românticos. Ninguém nunca me abordou entre um Fellini e um Godard. O corredor do Cinema Europeu era sempre vazio e fiquei triste quando, poucos meses depois, teve de encolher e dividir teto com seus irmãos Documentários, tão esquecidos pelos moradores de Santana, quanto eu.

Um domingo à noite, pelo meu amigo corredor, na companhia de Truffaut, Resnais, Moreira Salles, Coutinho e pensando que a pipoca teria muita manteiga desta vez, desemboco em Todos Dizem Eu Te Amo, que não era europeu e muito menos filmado no velho continente. Era um puro Woody Allen, nova-iorquino, que também brigava por um espaço na área fantasma da Blockbuster.

Woody Allen me acompanha desde então – ou vice-versa. Em minhas fases beats, tristes, tropicalistas, contemporâneas, azuis, desiludidas, alienadas, nacionais. Nunca mais abandonei seus diálogos, sua graça, suas crises, nosso amor pela Europa e o dele por uma Nova Iorque com cara de Europa. Esperar o novo filme dele é a garantia de que vou ter um daqueles domingos de volta. E quando esse momento chega, eu repito meu ritual: abro um vinho, preparo uma massa e vou me encontrar com ele.

Sempre senti falta de aplaudir bons filmes no cinema. Eu vou muito ao teatro e nada me chateia mais do que a “obrigação” do aplauso em peças que detesta. Em cinema, só presenciei algo parecido na pré-estreia de Cidade de Deus, na FAAP, há uns dez anos. Mas éramos jovens e eufóricos. Não sei se conta. Hoje, enquanto os créditos subiam, ouvi bem mais do que comentários e perguntas sobre o cartão do estacionamento. Ouvi aplausos. Aplausos merecidos. Era como se um pedido se realizasse. A pessoa que eu esperava naquele corredor, repleto de filmes rejeitados, estava ali comigo. E se multiplicava. Me juntei ao coro.

É meia-noite em São Paulo. Eu volto do filme com algumas frases anotadas e deixo tudo ecoando, enquanto subo a rua. Entro em casa e nem ligo a televisão para não contaminar. Falta alguma coisa ainda. Mas Woody Allen me consola “o presente é um pouco insatisfatório, porque a vida é um pouco insatisfatória”. E isso vai me preencher. Pelo menos por esta noite.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

SHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH

é dedo acorrentado mesmo. boca travada. enquanto no sangue correm todas as noites que eu gostaria de confessar. nossas luas costuradas em rascunhos impublicáveis. enquanto isso uma estátua de mim mesma, diante de uma tela preenchida com as músicas que eu quis presentear, mas deixei no carro. pro dia seguinte a sua festa de aniversário. pra nenhum olhar me reprimir. ignorantes da realidade em que me meti: o fundo daquele poço, onde uma vez me enterrei.
a sentimento cinza e fofoqueiro querendo abrir todas as portas e transformar-se em presente. não. eu não consigo mais abrir os pontos fora do meu quarto.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

BUSCA ETERNA

não é do que você fala, nem de quem você destrata, nem da situação que você explora, nem da raiva que te toma, nem do choro no gatilho, nem dum convite de última hora e das flores que entregaram pra outra. não se trata de vingança, daquela moça, de suas noites, de outro cara. nem do tapa na cara que levei esta madrugada.
é tudo sobre como usar as palavras de maneira elegante.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

eu lembro da tua mão esbarrando em copos. talvez um espatifado no chão. e lembro dela invadindo o decote de meu vestido indo se encontrar com minha cintura. eu lembro das fotos escuras que tirei. eu lembro de como eu sorria pro seu cabelo. e como tudo se esfarelava dois dias depois. e como aqueles dias, as nossas danças, todos os copos que bebemos e as suas madrugadas me rasgavam. lágrimas desgovernadas cegando o óbvio. seu sorriso mais forte que um flash. seu sorriso contador de nossas mentiras. 32 dentes me convidando pruma trama que agora jaz em fade out.
não vou aumentar o seu volume de novo.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Eu tava andando. Acho que colhendo flores. Ou outra dessas imagens bucólicas, que dão beleza a uma vida que só existe em quadro pintado ou na minha cabeça de vez em quando. Quando não quero olhar pro que é real. Só sei que acabei caindo nesse buraco. Não porque quis. Mas também não porque meus olhos me esconderam a presença dele. Talvez as folhas secas o acobertassem de maneira tão romântica que não. Não tive certeza de que o buraco só me esperava. como se consciente de que eu sou dessas que sempre tropeça e se deixa engolir por esse tipo de acidente. Até pensei, em algum momento antes da queda, que poderia haver algo estranho por ali. Mas são como aqueles momentos de beber água no meio de noitadas. Passa rapidinho. E aí sempre opto por continuar a colher flores.
E então caí. Tô aqui. Faz uns meses. Ele nem é tão fundo, eu sei. Mas estou tão fraca, que não consigo sair. Não consigo nem parar pra pensar em como poderia sair. Só penso em dormir no quentinho que faz aqui dentro. Porque também nem é mais primavera e não vejo flores pra colher lá fora. Lá fora nem tem mais sentido como antes.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

pensei por exemplo que toda vez que aterrisso ou decolo devo agradecer ao fato de ser mulher. meu coração é forte. aguenta estresse. amor. murro de decepção, então não é de enfarte que vou. mas quando desço de uma montanha-russa, a adrenalina é a mesma. alguma coisa sempre pode dar errado. a única bala do revólver. é como se a sensação de algo-pode-mudar-tudo sempre me rondasse com sorriso inquieto fincado na cara. retribuo. sem deixar escapar pra mim, naquele momento, que eu te levaria pruma montanha-russa. te levaria pruma roleta-russa.

segunda-feira, 14 de março de 2011

quando não

se Horácio entendesse de limites, Janaína não precisaria treinar o silêncio. se a areia não fosse áspera, as ondas não seriam tão agressivas. a reação que a reação provoca é cumulativa e sobe. sobe. sobe. sobe. até marear. até cutucar calçadas. até rachar os limites que Horácio não entende. transbordando no silêncio de Janaína. gotejando a paciência da moça. que um dia (a paciência) se afoga mesmo. os dois perdidos num mar. afastando-se. apagando-se. sem gritos. acenos. tentativas de resgate. nada. nem um pingo salgado de remorso. só a maré de quase olhares interrompida. um tsunami de desocasiões. destruindo os momentinhos que aportariam. ou naufragariam. ninguém sabe.

quinta-feira, 10 de março de 2011

DO CARNAVAL

que não fez o sol que meu biquini e maiô novinhos esperavam. que acordei e dormi cedo, mas me diverti um bocado. que não vi todas as pessoas queridas que também se alegravam no Rio, mas fui rodeada por outras. e reencontrei várias. :) que experimentei algo novo e não tão agradável: perder voo, não um, mas os dois. que tive medo de morrer no meio de um bloco cheio e até dei uma choramingadinha, mas fui consolada por desconhecidos e novos conhecidos. que fui expulsa de uma festa antes mesmo de chegar nela. que conheci melhor pessoas que eu só desconfiava que fossem incríveis - agora tenho certeza. que aprovei os casos de todas e deixei os meus pra mais tarde. que ganhei um monte de amigos novos no facebook e no celular. amizade de carnaval sobe a serra? espero que sim. :) um saldo positivo no final das contas.

terça-feira, 1 de março de 2011

chove violentamente. eu ateh penso em quem se mistura a papelao e enxurrada e sujeirinhas. mas nao eh como tah lah. eh como soh pensar pra tentar ser melhor. eu posso fechar a janela e aumentar o volume da tv enquanto ouço o ultimo lançamento do artista mais cool de los angeles. ou penso sobre o novo livro que comecei a ler. dum cara rico que finge renunciar os luxos pra ser escritor. um gole de vinho. que paguei com visa vale pq tah foda. pq meu pai disse que se eu morasse ainda com ele - e nao que eu queira, ele jah conserta - eu economizaria muito. e eu retruco que gastando essa quantia por ano eu to ganhando. mas ele pensa mais no valor material e devolve: ganhando onde? mais um gole. mais tv. melhor dormir. amanha o dia eh cheio. tem texto pra escrever. projetos pra pensar. amigos pra atender, tenho ateh de almoçar e tomar banho. entao...

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

é que eu prometi pra mim que nunca mais daria exclusividade, ao espelho do meu quarto, de minhas opiniões.
estrago almoços agora.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

algumas caras preguiçosas no meio de um Carnaval que poucos pularam. as bocas beijadas debaixo de edrodons fedendo a maresia e ilusão. cabeças conquistadas por diversão. ou rotina. ou tédio. ou por aquela carência que conheci tão bem. o amor próprio de alguém se esparramando pela mesa. caindo na calçada. inconsciente de um bueiro como destino. um desconforto telefonando ao taxi. mensagens secretas e escrachadas debochando de maridos em autofalantes arreganhados. copos quebrados. os olhares espertos. apaixonados. incomodados. medrosos. decepcionados. daqueles que enxergam as cores e frases debaixo da superfície de uma noite no bar. e um coração que ainda bate, implorando por um tiro.
à partir de agora este perfil não me pertence mais. mas vou colar aqui, porque gosto do texto.

"trabalho em tv. escrevi umas peças de teatro. tenho vários romances começados. tenho dificuldade de completar tarefas e palavras cruzadas. tenho tb uma gata. aliás tinha. ela fugiu no inverno passado. tenho pintas espalhadas pelo corpo e medo de barata. fiz uns cursos de roteiro, de dramaturgia e de literatura. sou tia de um sobrinho que olha pra mim e ri. sou bagunceira e sonhadora. sonho com o apê de flores na janela que eu não tenho. o meu quarto é grande e eu não caibo lá. minha preguiça não cabe lá. meu sono também não. e meus amores ficam salivados na fronha. mas ok. eu vou reagir."

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

FINALMENTE

assisti a José e Pilar. Achei uma beleza. E adorei quando o Saramago, lá da Europa, diz  que quando o Universo acabar, a Ilíada acaba junto. Algo assim. É isso aí. Quando ele acabar, este blog vai junto. E todos os comerciais de televisão. E a minha poupança. E tudo o que amei. E todos. E toda a importância que um dia eu dei a qualquer arranhão.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

É...

acho que hoje vai ser isso mesmo. fazer jantar. tomar banho. e assistir Queridos Amigos. ou ir ao cinema. mas o que eu gostaria mesmo seria passar minhas músicas pro i-pod. sem pensar. gostaria de nascer sabendo algumas coisas. e de que todo mundo me entendesse quando eu digo que tenho preguiça de certo tipo de gente e certo tipo de música e certo tipo de praia e certo tipo de gola V. agora eu to com preguiça de pegar essa chuva. ou porque vim de sapato claro. ou porque tá frio e to de saia. ou porque detesto a dança que faço quando desvio de poças. a timidez que exalo quando desvio de olhares. melhor mesmo é ter bastante legume nesse arroz à grega e comprar uma pilha pro controle remoto do DVD. rezar pro sono me enforcar antes da meia noite. e que o telefone não toque. não apite saudade. embora eu goste da falta que faço quando é madrugada e todo mundo bebe. eu vou sentar na poltrona mais distante das pessoas e comer o arroz gelado só depois. é muito provável que não goste do filme. e vou pensar se é pessoal ou não. e ficar puta se for. e tentar achar algum problema técnico se for. e meter o pau nos diálogos. e jurar baixinho, enquanto gesticulo raiva com as mãos, que nunca - eu espero - criar coisas forçadas. porque eu gosto de acreditar. mesmo que já tenha perdido essa inocência. e queira educar uma filha descrente. eu quero acreditar no que eu vejo. porque eu gosto quando as coisas fazem sentido também.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Beleza enche os olhos e, em frustrantes casos, esvazia a boca.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O COMEÇO...

Em São Paulo, hoje de manhã, chovia. Quer dizer, garoava na Zona Oeste e embora, meu cabelo brigue com a gravidade quando o tempo chora, eu ensolarei. Pensei São Paulo garoa, Eu faço sol. O ano é novo. 2011. E de pequena eu nem calculava quantos anos teria hoje. Impressionante mesmo era saber a idade na virada do século. Eu teria 19. Adulta demais. Número ímpar, não gostava. Preferia os pares. Me pareciam mais divertidos e escritos a grossas linhas. O ímpar não. O ímpar é sério. é maduro.
Estou na rua sentindo o fresco das borrifadas de água, que hoje não são mais minhas. Em 2011 eu quero. Eu quero água só pra beber. E da salgada, a do mar. Ou de uma história que sobrevive na boca de alguém. Eu quero adjetivos. As lembranças cheias de adjetivos. até os ruins que é pra eu não me esquecer dos centavos que me arranharam. Eu andei pensando. Muito. Tive um mês de guarda dos meus pensamentos. Chegamos a algumas conclusões. Tão óbvias. Tão difíceis. inevitáveis a esta altura. Eu quero. é só mais uma tentativa. Limpar o peso de ver o que odeio. Ser leve, mas ímpar.

FELIZ ANO NOVO!
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