segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A HORA DE DORMIR




As pálpebras dele enganchadas a âncoras. O bocejo contaminando. Ele resiste ao desmaio. Insônia como opção. Encher a cabeça de informação, porque quando tudo se aquietar e o corpo ceder, só um pensamento: a maneira como ela enrolava o cabelo num coque e sorria perguntando se estava bom. E o perfume dela que apareceu na noite passada, quando ele bebia sozinho num balcão, e a vontade de não identificar a pessoa, para não destruir essa reaproximação. Era como abraçá-la de novo. Igual ao episódio da farmácia, quando brigaram, conforto e promessas de vai-dá-tudo-certo-pra-sempre-eu-sei-que-vai.
O que falta não tem nome. É espaço inabitável. Acordar ao lado dela foi só miragem. Enquanto ele esfregava os olhos, ela desaparecia, levando aquele bônus de tranquilidade junto; e a sacolinha da loja de roupas com o secador e as calcinhas. 
Sonhar tem sido triste e difícil de desviar. Ele não vai controlar por muito tempo, em poucos minutos, ela protagonizará as mesmas histórias descontínuas. 
Ao despertar, ele vai se ocupar de livros e café e faxina, atividades que a dissipem. Algo que a faça adormecer até o próximo encontro. O próximo cansaço vencido.


quarta-feira, 12 de setembro de 2012

CENA FINAL




Um guarda-roupa abarrotado de lembranças: eu preciso escolher entre um sapato, que odeio e aquele que você me sorriu de presente.
Saio descalça com música no ouvido pra preencher as reticências que você deixou. Pensar, hoje, torce o peito. O olhar namorando o chão. E aquele carro quase me atropela, porque me distraí contemplando ontem, quando você me presenteou com aquela mensagem comprida. E penso, enquanto meu pé esquerdo se fere numa pedrinha afiada, que eu gosto quando você me chama pro palco. E como foi frase dura, curta – um tiro e ponto – te ver molhando o indicador com sua saliva e virando nossa página. O meu descer as escadas, olhar a placa de saída – escrita com um erro ortográfico – rodar a chave, te entregar a chave e sumir - a duzentos km por lágrima. Gasolina vazando pelas ruas do seu bairro, como se fossem sementes minhas -  na esperança de me florescerem. Um busto meu manchando a fotografia da sua janela, imagem enjoativa, que te afasta.
Buracos, buracos e mais buracos, ocos. Como minha caixa de mensagens. Como esses dias. Como minha presença.

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