domingo, 17 de março de 2013

O VESTIDO E O VENTO MALICIOSO DA CIDADE

ou

Ela desce a rua.


foto retirada do site weheartit.com


   Ela desce a rua como se. Não encara o céu. Ignora olhares e quase sempre tropeça. Buzinas. Os semáforos piscam. Os carros escorregam pela avenida que parece viver entupida de estresse. Ela tem um vestido que se espreguiça sempre que um vento assopra. Uma espécie fajuta e romântica e mais colorida de uma Marilyn Monroe vulnerável. A cada esquina, um amor acena. Aquela festa com quatro pessoas e um amasso no elevador vermelho e charmoso. A janela do apartamento em que ele morava, num prédio sem vida, incomodado frequentemente pela cidade acordando, pela cidade se divertindo, pela cidade voltando pra casa acelerada de tanta bebida ou pó, desafiando os radares, os pedestres e a conta bancária magra  e  farta de multas.

   Ela desce a rua como se precisasse chegar a algum lugar. Nunca se perguntou o que quer. Apenas vive. Desliza nos seus dias sem controle.

   Ela desce, o vestido repete a estripulia. As mãos dela, carregando unhas pintadas de azul claro como daquela vez em seu aniversário, vetam o tecido. Ele enfrenta. Provoca. Ordena. O vento como aliado. Ao redor, as pessoas se divertem, apenas uma mendiga se posta indiferente e grita alguns palavrões para si enquanto organiza o seu papelão na porta de uma loja falida.

   Ela não precisa chegar a lugar nenhum. Ela não precisa chegar. Ela só precisa relaxar. Talvez alcance algum lugar assim. E então, como em uma coreografia, seus fios de cabelo, suas mãos e a saia do vestido se libertam. Evaporam. Deixam o vento guiar. 

   Ela desce a rua dançando com o vento malicioso. Aonde pretendem aterrissar?

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