sexta-feira, 3 de maio de 2013

ROBERTA INDICA: NO TEU DESERTO, DE MIGUEL SOUSA TAVARES


SOBRE O SILÊNCIO





O nome do autor é  Miguel Sousa Tavares. Ele nasceu na cidade do Porto, Portugal, em 1952.


Uma amiga querida disse que tinha um livro que eu iria gostar muito.


Gosto de prestar atenção nessa troca de energia que existe entre as pessoas. Troca de livros é troca de energias. É partilhar com o outro palavras. Dar ideias de presente.


O livro: "No Teu Deserto". O autor, Miguel Sousa Tavares: um jornalista que, vinte anos antes de escrever esses relatos, tinha atravessado o deserto do Saara.  Ele, um jipe e uma moça que ele conheceu na viagem, uns quinze anos mais nova que ele.


O livro é uma ode ao silêncio.


É dele esse trecho:


" (...) e eu sentia-me bem assim, protegida pelo som da tua voz, pelo teu relato de florestas distantes e estranhos nomes de peixes e bichos que ali pareciam tão irreais como irreal me parecia toda esta felicidade que não te sei dizer! E só percebi quando a perdi.


A maior parte do tempo, porém, o que nós partilhávamos era o silêncio. E isso eu aprendi contigo, porque não sabia. Para mim, o silencio era sinal de distância, de mal estar, de desentendimento. Ao princípio, quando ficávamos calados muito tempo, eu sentia-me inquieta, desconfortável, e começava a falar só para afastar esse anjo mau que estava a passar entre nós.


Um dia tu disseste-me:


- Claudia, não precisas de falar só porque vamos calados. A coisa mais difícil e mais bonita de partilhar entre duas pessoas é o silencio."


Lendo o livro lembrei de um filme. Talvez um dos mais belos filmes que eu já vi. "Camelos Também Choram".


Lembrei dele pelos camelos, pelo deserto, e pela economia de palavras.
Esse filme quase não tem diálogos. Praticamente não tem trilha sonora, só o som do vento de areia. O filme é sublime. Assim como é sublime a vida dos nômades do deserto. A comunicação que dispensa quase tudo.
Mantém somente o lindo e mágico entendimento entre as pessoas.
Sem exageros. Só o essencial.


Pensando no silêncio e no bonito deserto que, parece-me porque espelho, está dentro de mim.


Lembrei do Deserto do Atacama, 2008. Uma viagem linda.


Aí lembrei de 2009, dez dias caminhando pelo litoral do Uruguai. O deserto das praias uruguaias.


Vale a pena conhecer as praias do litoral do Uruguai: Caminhar por elas é inacreditavelmente reparador para a mente. As praias uruguaias não têm o recorte e a vegetação que conhecemos no litoral brasileiro. São como um deserto de dunas.
Olhar o monocromático da areia e do mar descansa os olhos. Sossega dos excessos de estímulos visuais.
A ausência da poluição visual permite sua mente vagar livremente...


Estar na natureza é a coisa mais importante da minha vida. Não abro mão desse contato nem um ano sequer.


Ela sempre consegue me mostrar o que tá passando dentro da gente.


Amós Oz... o escritor israelense, sabe disso. Ele vive no deserto.


"Há 20 anos, moro numa pequena cidade no deserto chamada Arad, no sul de Israel, cercada pelo deserto...Todas as manhãs, acordo cedo, às 5h, tomo uma xícara de café, vou ao deserto e caminho em silêncio, sozinho...O deserto me ajuda a ver as coisas em perspectiva; ele me ajuda a descobrir o que é importante e o que não é importante. O deserto é uma experiência de humildade e uma profunda inspiração."


Por que não construir um pequeno deserto particular de silêncio e sossego, e se debruçar sobre “No Teu Deserto”? Se deliciar com as descrições de uma viagem, que acabou mudando pra sempre a vida desse jornalista?


Porque não aproveitar a economia de palavras e assistir Camelos Também Choram” ?


Odes ao silêncio.


" (...) - Mas tu não poupas as palavras: tu escreves. Todas as noites gastas uma hora a escrever um diário nesse teu caderno...


- Escrever não é falar.


- Não? Qual é a diferença?


  • É exatamente o oposto. Escrever é usar as palavras que se guardaram: se tu falares demais, já não escreves, porque não te resta nada para dizer."



Trecho de “No Teu Deserto”



Serviço
No Teu Deserto
Autor: Miguel Sousa Tavares
Editora: Oficina do Livro

Camelos Também Choram
Diretores: Byambasuren Davaa e Luigi Falorni
Ano: 2003


*

A autora do post: Roberta Nader é ativista pra mudar o mundo. Roteirista no horário comercial. Leitora compulsiva. Escrever é uma vontade... Que nunca passa. 
Leia o blog dela clicando aqui.

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